segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Angra - Aurora Consurgens

        De 2006, este Aurora Consurgens é com certeza o disco mais injustiçado das duas décadas de estrada do Angra. Gravado num momento muito conturbado para a banda, no qual o relacionamento entre os membros não era dos mais cordiais, temos um trabalho de ótimas músicas, que mantém o excepcional alto nível das composições desses músicos lendários e de um talento inquestionável. E ainda temos o fato de que ele é o sucessor de uma das obras-primas da história não só do metal brasileiro, mas também do metal mundial, “The Temple of Shadows” (2004). Uma tarefa bastante ingrata, diga-se de passagem.
          Mas mesmo assim existe um porém neste disco: ele peca justamente na concepção de “álbum”. Todas músicas são muito boas, inegavelmente, porém elas parecem integrar uma coletâneas de boas músicas que não foram aproveitadas em outros discos. O que eu quero dizer com isso é que elas não tem conectividades, que parecem avulsas e aleatórias no track list, e exatamente por isso “Aurora Consurgens” não tem aquela cara de álbum, onde a ordem das músicas é matematicamente calculado para transmitir ao ouvinte sensações específicas. Só que isso, ao menos na minha opinião, não tira de forma nenhuma o mérito das músicas, já que nenhuma delas eu conseguiria considerar fraca ou mesmo ruim.
         Os trabalhos começam sem termos a tradicional faixa intrumental introdutória (coisa que suscinta várias teorias conspiratórias entre os fãs internet a fora), sendo com 'The Course of Nature', que é o single mais pesado já lançado pela banda, que teve um clipe que até chegou a passar algumas vezes na programação da MTV. É uma faixa espetacular, com os primeiros segundos dominados por percussões brasileírissimas, que depois desandam em riff's bem pesados e intensos, linhas de baixo poderosas e uma muito boa interpretações de Edu Falaschi, que sabe usar muito bem os tons mais agressivos de sua voz. Logo depois temos talvez a melhor do disco todo, que é tocada nos shows até hoje, 'The Voice Commandig You'. Começa com guitarras em tons meio progressivos, aliados com a sempre afiada de Aquiles Priester (mas é preciso dizer: este trabalho não é o de maior inspiração do baterista). A letra é interessantemente construída para acompanhar a melodia, com ponte e refrão que esbanjam intensidade e deixam o ouvinte sem fôlego. Individualmente nota 10!
       'Ego Painted Grey' tem uma dose de peso considerável, mas tem alguns contornos de semi-balada, com momentos até épicos eu diria. Começa calma e intimista, com alguns acordes de piano, mas logo depois já temos guitarras trazendo mais vigor ao som, baixo sempre atuante de Andreoli e ainda um refrão bonito e inspirador. Outra bela faixa que mostra o talento musical desses caras. Já 'Breaking Ties' tem moral para figurar entre as músicas mais lindas que o Angra já fez. Os bonitos efeitos que a introduzem dão o clima para o que vem depois, uma balada pesada e cadenciada repleta de feeling, tem uma letra triste, mas o conjunto da obra a torna naquele tipo de tristeza bela e inspiradora. Em suma, belíssima.
         Causou uma certa polêmica na época a faixa seguinte, 'Salvation: Suicide'. Muita gente se perguntou se a banda estaria mesmo fazendo apologia ao suícidio. Mas decididamente não é o caso, já que o tema da maioria das músicas do disco são os escritos medievais de São Tomás de Aquino sobre distúrbios mentais. A música tem ares progressivos, com alguns riff's bem cortantes e diretos, e solos bem trabalhados e competentes. É muito boa sim, mas não é das que mais chama a atenção, e por si mesma mereceria uma nota 7. 'Window to Nowhere' segue uma linha meio parecida com a anterior, mas mais interessante, com o instrumental ainda melhor trabalhado. Tem uma melodia bem marcante, que ecoa por toda a sua duração, e que chama a atenção do ouvinte.Um dos belos destaques positivos.
        Mais uma pérola: 'So Near So Far'. Já de cara com uma introdução interessante, com alguns elementos que remetem à música árabe, e que depois se torna uma canção linda, repleta de feeling, com percussões, presença intensa das guitarras, baixo competente e um clima construído com todo o esmero. E feeling támbem não falta em 'Passing By', que conta com ótimas atuações dos guitarristas, discretas linhas de teclado, Edu cantando muito bem e uma atmosfera envolvente. É quase uma balada, que toma corpo aos poucos e que chega num refrão intenso e marcante.
          É um heavy metal muito competente a faixa 'Scream Your Heart Out'. Pesada, técnica, mais uma com lampejos progressivos e de andamento muito interessante. A banda toda manda muito bem, fazendo uma canção não das mais brilhantes e impactantes, mas que com certeza prima pela qualidade e técnica. E o track list regular termina com a acústica 'Abandoned Fate'. Sinceramente, o disco poderia terminar com uma faixa mais aprópriada, pois o clima melancólico da música (que é absolutamente lindo) ficaria melhor encaixado em outro momento do disco, não exatamente para encerra-lo. Tem uma sutil levada de blues, bastante soturna, que garante a música isoladamente um feeling muito bom mesmo, mas que no conjunto final do disco acaba destoando um pouco.
          E na versão japonesa do disco tem a faixa bônus 'Out of This World', interpretada por nínguem mais nínguem menos que o polivalente guitarrista Rafael Bittencourt (que durante o ócio entre este “Aurora Consurgens” e o “Aqua” lançou um ótimo disco de seu projeto Bittencourt Project). Acredito que se ela estivesse no lançamento regular, seria a ideal para encerrar o trabalho, pois tem um clima perfeito para isso, uma levada legal, instrumental tão bem trabalhado quanto o de todas as demais músicas e não deixando nada a desejar quanto a mixagem e masterização. E pelo quesito letra também, pois é uma homenagem ao Marcos Pontes, primeiro astronauta brasileiro. Analisando-a em relação aos temas das outras músicas, seria sim um encerramento absolutamente digno então.
         É um disco sim injustiçado, que tem suas falhas, e que não denota um momento de completa criatividade e inspiração inquestionáveis. Mas em hipótese nenhuma pode-se dizer que “Aurora Consurgens” seja um disco ruim. Certo que não é aquele brasileirismo intenso e aflorado da época do Andre Matos, nem tem o vigor de um “Rebirth” (2001) ou a absurda criatividade e inspiração do “Temple of Shadows”. Mas ele tem sua cara, seu jeito de ser, e isso faz de “Aurora Consurgens” um trabalho único, que não é nem melhor nem pior que nada que esta lenda do Metal brasileiro chamada Angra já fez em sua vitoriosa carreira.

A formação do Angra era:

Edu Falaschi – Vocais
Kiko Loureiro – Guitarra
Rafael Bittencourt – Guitarra
Felipe Andreoli – Baixo
Aquiles Priester – Bateria



Track List:

  1. The Course of Nature (4:30)
  2. The Voice Commanding You (5:27)
  3. Ego Painted Gray (5:38)
  4. Breaking Ties (3:29)
  5. Salvation: Suicide (4:21)
  6. Window to Nowhere (6:02)
  7. So Near So Far (7:09)
  8. Passing By (6:32)
  9. Scream Your hear Out (4:25)
  10. Abandoned Fate (3:09)
  11. Out of This World (Bônus apenas na versão japonesa) (4:35)


Creio que o CD ainda esteja em catálogo, e se encontre na maioria das lojas de discos, e por isso vale a pena ser adquirido por quem é fã da banda e ainda não o tem.

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